sábado, 10 de maio de 2008

Infinitos Graus

Inverno
Ligo o chuveiro e vejo você
em cada desenho do azulejo
Deixo os cabelos se molharem
enquanto as costas
só aguardam sua vez
Os pés já absorveram a frieza do chão
antes mesmo dos pêlos braçais arrepiarem
Bebo a água pra dentro também molhar
Os cílios juntam e passo a mão
para abrir os olhos e deles vazam gotas
mas não são águas do mar,
são doces águas descaídas do chuveiro
e com elas esfrego, arranho, arrasto
a pele morta do corpo
deixada da secura de outros banhos
para deste sair fresca
E neste sou Poetisa, Poeta Fêmea
Efígie efervescente
Esfolada
Escorrendo
Enforcada pela água que resvala da nuca
e encharca o peito
Esta água tem cheiro de estória
e sinto dizer, mas neste banho
Não vou rimar
A Rima provavelmente
desceria pelo ralo e
perder-se-ia num esgoto qualquer
e minhas rimas são trilhas de
outras palavras e
estas definitivamente junto com
estes advérbios e alguns
monossílabos não podem escoar
assim...

Acabou, o sabão já deslizou
até o piso e estou pronta
Apenas me desfaço dos fios de cabelo
grudados, escondidos, disfarçados
no corpo

Meu telefone toca
e você sente agora
o eco da minha voz
e o embaço do espelho.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Ne Me Quitte Pas

Ne me quitte pas
Il faut oublier
Tout peut s'oublier
Qui s'enfuit déjà
Oublier le temps
Des malentendus
Et le temps perdu
A savoir comment
Oublier ces heures
Qui tuaient parfois
A coups de pourquoi
Le coeur du bonheur
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Moi je t'offrirai
Des perles de pluie
Venues de pays
Où il ne pleut pas
Je creuserai la terre
Jusqu'après ma mort
Pour couvrir ton corps
D'or et de lumière
Je ferai un domaine
Où l'amour sera roi
Où l'amour sera loi
Où tu seras reine
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Je t'inventerai
Des mots insensés
Que tu comprendras
Je te parlerai
De ces amants là
Qui ont vu deux fois
Leurs coeurs s'embraser
Je te raconterai
L'histoire de ce roi
Mort de n'avoir pas
Pu te rencontrer
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
On a vu souvent
Rejaillir le feu
D'un ancien volcan
Qu'on croyait trop vieux
Il est paraît-il
Des terres brûlées
Donnant plus de blé
Qu'un meilleur avril
Et quand vient le soir
Pour qu'un ciel flamboie
Le rouge et le noir
Ne s'épousent-ils pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Je ne vais plus pleurer
Je ne vais plus parler
Je me cacherai là
A te regarder
Danser et sourire
Et à t'écouter
Chanter et puis rire
Laisse-moi devenir
L'ombre de ton ombre
L'ombre de ta main
L'ombre de ton chien
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas

Jacques Brel

sexta-feira, 2 de maio de 2008

A Rosa Branca e o Violão

Em todos os nasceres e ocasos, um Violão muito solitário sonhava com o dia que poderia tocar para a sua amada.
Pensou que talvez encontrasse uma Viola bem charmosa e juntos vibrariam cores ao tocar, mas nenhuma Viola queria aquele Violão, diziam que ele era sem graça, tocava sem paixão. Pobre Violão, sabia que tocava sem paixão, mas como tocaria com tal emoção se por ninguém a sentia. Pensou então, vou procurar uma bela Gaita, quem sabe ela sem conhecer as cordas me admire, mas a Gaita disse: " Ah, seu Violão, fui feita pra andar lado a lado à solidão, nasci apenas pra preencher bocas e não algum coração". Pobre Violão, foi procurar logo a Gaita que só queria solidão, mas este Violão estava disposto a amar e foi perguntar à Arpa se com ela poderia tocar; ela sem hesitar disse Não, " meu som é sublime, não posso me misturar, seu som é de um boêmio caipira qualquer, sinto muito, mas não posso te amar." Pobre Violão, caiu então na desilusão, conformou-se a eternidade vazia, sem notas de amor, sem notas de felicidade, sem notas de consolação.
Porém, como o Amor não existiria se não existisse quem senti-lo, resolveu ajudar o Violão. Disse: " Ei caro Violão, quer me sentir e acabar com esta solidão?" E o Violão: " Claro, Sr. Amor, mas como o farei se ninguém comigo quer tocar?"
" Seu Violão, Seu Violão, ela está além do que se pode ver! Não pense, deixe acontecer!"
Então assim, o Violão passou tempos sem procurar, sabia que na hora certa a sua cadência ia chegar!
Passeando e cantando estava, quando viu entre tantas Rosas rosas uma única Branca Rosa.
Não segurou: " Rosa!"
E todas olharam...
" A Branca!"
E ela na sua brancura roseou, era vergonhosa, mas perguntou: " Será você mais um a dizer que nada sei fazer a não ser destoar?"
" Não Branca, desculpe a sinceridade mas meu coração não pára de pular, hoje te encontrei para ser meu par."
" Um Violão e uma Rosa não são um par, já procuraste uma Viola pra te amar?"
" Procurei e só me enganei, vejo você e sei que vou te amar, mas me diga, com tantas flores por que sozinha ainda estás?"
" Cravos, Lírios, Crisântemos tentei amar, todos se consideravam melhores, que eu era desbotada, uma Rosa Vermelha que era feita pra ser guardada."
Neste momento o Violão e a Branca Rosa se olharam e decidiram não mais falar, sabiam que dali pra frente o mundo inteiro o amor dos dois iria invejar. Neste Jardim onde a beleza dela inspira ele e a música dele inspira ela, o amor se materializou.
A solidão nunca mais neles morou.